A obsolescência programada dos fones de ouvido: quantos você já jogou fora?
Esse "avanço da tecnologia" só é avanço pras empresas de tecnologia. Pra nós, é apenas gasto cíclico e contaminação da meio ambiente
Lá estava eu treinando na academia, ouvindo “The Town”, meu podcast favorito, quando senti um leve chiado, uma fraqueza no ouvido direito. Tentei ignorar, mentir pra mim mesmo, mas eu já sabia o que era. Meu fone de ouvido estava dando seus últimos suspiros. Poucos dias depois, o inevitável: tive que malhar metade ouvindo notícias de Hollywood, metade ouvindo hétero gemendo escandaloso no supino.
Esse talvez seja meu décimo fone de ouvido que deixa de funcionar nos últimos 5 anos. Não estou brincando.
Eu sei que você também já passou por isso. O aparelho para de funcionar sem explicação. E é sempre só um deles, né? Nunca são os dois. Você fica na dúvida se vale a pena continuar “mononaural” ou ter que gastar uma grana imprevista pra comprar outro parzinho. Nunca é barato.
Talvez consertar? Você busca no Google. Nunca tem um lugar perto. Você precisa levar lá para eles fazerem o orçamento. E o valor nunca é razoável. Sempre parece simplesmente mais prático comprar um novo. (É o que os fabricantes querem, afinal.)
…e lá se vai mais um fone para o lixão do mundo. Plástico que levará centenas de anos para se deteriorar. Substâncias químicas que levarão só alguns meses para contaminar o solo e talvez lençóis freáticos. A estimativa é que todo ano, mais de 100 milhões desses aparelhinhos vão parar no lixo.
E toda vez eu fico tomado por uma raiva fenomenal. As big techs foderam nossa vida mais uma vez.
O surgimento do fone de ouvido true wireless (esse que funciona via blutooth) não foi uma jogada para facilitar nossa vida. Foi mais uma estratégia (inicialmente só da Apple, mas depois copiada por todo o mercado) para continuarem faturando mesmo quando a gente decide não trocar o celular anualmente, como eles gostariam.
Assim como os telefones, os fones de ouvido são desenhados de modo que consertá-los é quase impossível. A bateria é colada. Lá em 2016, uma reportagem do New York Times já confirmava o que todos suspeitávamos: cada vez que você recarrega seus AirPods, eles rendem um pouco menos. Eventualmente, as cinco horas iniciais de música ininterrupta reduzem para uma. Então, mesmo se eles não derem algum outro problema técnico, você vai precisar trocá-los.
Esse é o conceito de obsolescência programada, tão bem explicado no documentário A Conspiração Consumista, que bombou na Netflix no finzinho do ano passado. (Precisa de mais motivos para odiar a Apple, a Amazon, etc? Assista.)
Ao criar este “grande” avanço da tecnologia, nos tiraram a opção de usar os fones antigos, com fio. A entrada do tipo P2 foi eliminada dos celulares. Depois de gastar entre 150 e 400 reais em diversos modelos de fone “moderno”, tudo que eu gostaria era poder voltar a usar um fone de fio que me custasse só 30 reais. Foda-se o som, eu só não quero mais colocar dinheiro na mão desses caras e me sentir um trouxa.
E isso porque ainda tive certos privilégios. Meu curto período como editor de Tilt, a editoria de tecnologia do UOL, me rendeu dois fones de ouvido. Um da LG, que durou quase um ano, outro de uma grife da família do Bob Marley, supostamente ecológico, que além de péssimo som também quebrou misteriosamente. (O dia em que descobri seu preço no varejo, quase caí pra trás. Família Marley vai espremer o bagaço desse sobrenome até não sobrar nada, né?)
Minha última tentativa de “rebelar contra o sistema” foi comprar um desses fones vagabundos de marca genérica, numa barraquinha perto da academia. Aguentou por quatro meses. Agora eu fico na dúvida: eu quero gastar 999 reais (!!!) num produto de mais qualidade, mas que também não me dá garantia nenhuma de que continuará funcionando por mais tempo que um de 150? Me sinto numa roleta de cassino.
Eu literalmente só uso os fones pra treinar. Quase não faço esteira, nem impacto eles sofrem. Não entro na água. Não deixo cair no chão. A cada novo gasto, cuido como se fosse uma joia (certamente uma pedra preciosa seria mais resistente). E ainda assim, eles continuam me falhando. A única confiança absoluta que tenho hoje é de que eles irão falhar. O capitalismo, porém, não falha nunca.
O que chega no streaming e nos cinemas
Finalmente chega no Brasil um dos filmes LGBTQIA+ mais elogiados do ano passado: o misto de drama coming-of-age e terror cabeçudo “Eu Vi o Brilho da TV”, dia 10, no Max. A semana certamente tem destaques maiores, mas a chance de você nem ser dar conta de que esse filme existe é grande, então estou aqui avisando.
Assim como “Corra!” era um terror com aspirações de discutir o racismo, “Eu Vi o Brilho na TV” na verdade é uma alegoria sobre autodescoberta queer. Situado nos anos 90, ele companha dois adolescentes excluídos na escola que acaba se aproximando porque tem a mesma obsessão: um show de TV fictício, no estilo “Buffy, a Caça-Vampiros”, chamado “The Pink Opaque”.
Ao longo dos anos, eles vão se reencontrando e se afastando, em constante questionamento da própria identidade sexual, tal qual a metamorfose dos monstros de “The Pink Opaque”. Será que a série era mais do que eles imaginavam? Ou talvez menos, agora que a vida adulta confere um pouco de distanciamento?
🔷 Tá com tempo aí na sua agenda? Algumas das séries mais aclamadas da atualidade voltam com novas temporadas: “O Conto da Aia” (T6, dia 9, no Paramount+), “Black Mirror” (T7, dia 10, na Netflix), “Hacks” (T4, dia 10, no Max) e “The Last of Us” (T2, dia 13, no Max).
🔷 Como desgraça pouca é bobagem, no dia 11 a AppleTV+ também lança uma grande aposta para o Emmy 2025: o drama “Seus Amigos e Vizinhos”, em que Jon Hamm (“Mad Men”) interpreta um ricaço falido que começa a roubar a vizinhança.
🔷 Pra pensar menos e se divertir mais: o filme “G20”, dia 10 no Prime Video, traz Viola Davis como a presidente dos EUA que resolve ela mesma, na porrada, uma crise terrorista durante a cúpula do G20.
O que rolou no canal essa semana
1/4: eu e André aproveitamos o Dia da Mentira para nos divertir num bate-papo ao vivo com a galera sobre as piores mentiras que os gays contam. Venha pela fofoca do público, fique pelo microshorts do André que causou furor nos comentários (não, não era uma cueca)
4/4: tema vitorioso na enquete mais recente do canal, criei pra vocês a minha lista particular com os 10 melhores filmes gays brasileiros. Foi difícil, viu? Favor prestigiar:
Beijos!
Eu continuo usando com fio!
Na Santa Ifigênia comprei fones wireless por 100 reais que está durando dois anos já. É daqueles que parece um arquinho de cabelo mas que passa atrás da nuca.